Quando o corpo feminino se torna alvo de falsas promessas
Confira a coluna desta terça-feira (11)

A minissérie “Vinagre de Maçã” expõe um mercado perigoso: a venda de falsas promessas para a cura do câncer. Mostra pessoas desesperadas por uma chance de sobreviver atraídas por tratamentos “milagrosos”, muitas vezes sem comprovação científica e com promessas que jamais serão cumpridas. No fim, o que deveria ser um direito – acesso a um tratamento eficaz – se transforma em um mercado lucrativo baseado na manipulação da esperança.
O paralelo com o lipedema é inevitável. Mulheres que sofrem com a doença são constantemente expostas a soluções que mais exploram sua vulnerabilidade do que realmente ajudam. Descrito pela primeira vez em 1940, o lipedema foi, por décadas, ignorado pela comunidade médica. Só em 2022 recebeu um código próprio na Classificação Internacional de Doenças (CID), tornando-a oficialmente reconhecida. A mudança possibilitou avanços no diagnóstico e tratamento, mas também abriu espaço para um fenômeno comum na indústria da saúde: a corrida por soluções rápidas e lucrativas.
Se antes as pacientes com lipedema ouviam que seu problema era apenas excesso de peso e falta de esforço, agora se veem cercadas por um novo tipo de armadilha. Procedimentos estéticos, protocolos “exclusivos”, dietas supostamente feitas sob medida e até terapias injetáveis são vendidos como se fossem a cura para a condição.
Isso não significa que não existam formas de melhorar a qualidade de vida de quem tem lipedema. O problema está na forma como essas soluções são vendidas. Algumas abordagens podem até trazer alívio temporário para os sintomas, mas não interrompem a progressão da doença.
O lipedema é uma doença inflamatória, com predisposição genética e comportamento diferente da gordura comum. Não desaparece com dietas restritivas, exercícios intensos ou procedimentos superficiais. Mas, o discurso dominante ainda gira em torno da estética, e não da saúde. Se a medicina já demonstrou que o lipedema pode causar dor crônica, limitações físicas e impactos psicológicos, por que tantas abordagens comerciais continuam tratando a condição como questão puramente estética?
O mercado da “cura milagrosa” se alimenta da falta de conhecimento e da desinformação. Enquanto os estudos avançam lentamente, promessas duvidosas surgem a todo momento, oferecendo atalhos que não existem. O pior é que esse ciclo de falsas promessas acaba descredibilizando as terapias que realmente fazem diferença. O lipedema exige uma abordagem multidisciplinar, que inclui drenagem linfática, fisioterapia, meias de compressão, alimentação balanceada, exercícios direcionados, controle da inflamação e, em alguns casos, cirurgia especializada. Mas em meio a tantas promessas, até mesmo os tratamentos baseados em evidências acabam se confundindo com os modismos.
Se há uma lição que podemos tirar de “Vinagre de Maçã”, é que a esperança não pode ser transformada em mercadoria.
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